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As Minhas Memórias - última parte - Arquitectura ou Dança?



Escolher entre a profissão académica e a profissão do coração, foi uma das decisões mais difíceis, se não, a mais difícil que tive de tomar até hoje.
A escolha que acabei por seguir, não a decidi de um dia para o outro, demorei anos a perceber que um caminho, embora bem visto pela sociedade, me levaria á frustração e o outro, completamente mal interpretado, me desafiaria ao longo da minha Vida.
Como todos sabem, segui o que o coração me gritava: Dançar.

Como todos os adolescentes, tive imensas dúvidas, principalmente a partir do 9ºano, do que queria fazer quando fosse adulta. Embora soubesse que a minha paixão fosse a dança, cresci a ouvir dizer que isso não era profissão, que a Arte em geral não enchia barrigas, não pagava contas e o pior: era mal visto. Desde a pintura, á escultura, ás artes gráficas, ao teatro, etc... não era um trabalho, era qualquer coisa... menos uma profissão digna. Todas menos Arquitectura.
Como sempre percebi que não poderia seguir dança ( a clássica) pensei sempre em seguir alguma coisa relacionada com Artes e claro só tinha uma hipótese digna de satisfazer a sociedade, ou melhor, os meus pais, se é Artes, só pode ser Arquitectura. E lá fui eu! Todos (pais) super orgulhosos e eu completamente iludida a entrar na faculdade...

Muitos perguntam-me ou ficam admirados por:
1º ter um curso superior - uma bailarina de dança oriental formada?!!!
2º Arquitectura - não é um curso qualquer, dizem muitos, é uma formação respeitável!
3º e agora danças... Dança Oriental?!!! - o que se passou pela minha cabeça, ter uma licenciatura e trocar isso por dança?!!

Pois posso dizer toda orgulhosa que sou licenciada em Arquietctura pela faculdade Lusíada, e não me arrependo nada de ter estudado e ter ido para a faculdade. Mas não amava Arquitectura, não sonhava em ser arquitecta, eu nem sequer sabia bem o que isso era... fui porque tinha de ir, não queria desiludir os meus pais, e pensava, vou aprender e vou acabar por gostar e seguir uma grande profissão!
Durante os seis anos (chumbei logo no primeiro ano, para verem a ilusão que estava metida) de faculdade "sofri" uma das maiores transformações: passei de criança a adulta e foi lá que, através da própria formação, colegas, e extraordinários professores que tive o privilégio de ter aulas, percebi que não adianta lutar contra a nossa natureza e o mais importante é seguir o que nos vai na alma, nem que para isso choque tudo e todos á nossa volta.
Foi isto que aprendi na faculdade: armas para lutar pelos meus sonhos.
No início do curso percebi logo que não achava muita piada aquilo, fazia por pura obrigação, já que lá estava tinha de continuar... a meio do curso já um pouco desesperada por nunca mais terminar, conheci o meu marido (a faculdade também serviu para isso, além de me encontrar a mim própria, encontrei o Amor da minha Vida) e foi ele que me ajudou a continuar. Nos últimos dois anos, só pensava em desistir, tinha começado a ter as aulas de Dança Oriental, que me fez repensar naquilo que realmente queria para a minha vida, já não aguentava mais aquele curso e aquela faculdade.
No último ano pensei mesmo em sair, mas como estava a terminar, decidi (e ainda bem que o fiz) terminar, embora, no meu intimo já tivesse decidido que acabava o curso mas nunca mais pegaria num projecto. E foi isso que aconteceu! Acabei a faculdade á seis anos e o meu último projecto foi o meu trabalho final de curso... e digo-vos que não tenho saudades nenhumas!
Queria ser bailarina, o meu sonho de criança... e imaginem quando disse isto aos meus pais... não, não imaginam!
Gostaria muito de vos dizer que os meus pais aceitaram lindamente, aplaudiram de pé e me disseram: força filha!!! Claro que isso não aconteceu, muito pelo contrário...
A desilusão de eu não seguir uma profissão "digna" e que tanto projectaram para mim foi grande, e ainda hoje, embora a uma outra escala, acham que não trabalho, faço algumas coisas... mas não é trabalho com futuro.
Se é ou não, não sei, mas pelo menos tive a coragem de seguir aquilo que realmente queria e ninguém me pode dizer que fui "obrigada" a dançar. Segui o meu coração, mas foi muito difícil enfrentar o estigma da sociedade, pais e até os meus próprios preconceitos e tabus.
Só depois de ter começado a dar aulas e a apresentar-me em público é que comecei a entender o difícil caminho que tinha escolhido, pois de de inicio pensei que tudo iria ser mar e rosas. Mais uma vez iludida!!! Tive e tenho de trabalhar muito e provar muito a muita gente que não era uma decisão por puro capricho de menina mimada.
E provei!!! Embora os meus pais continuem a achar que não é profissão e que não trabalho, aparentemente, respeitam a minha decisão, mas não aprovam... e ainda hoje sinto uma mágoa por isso... queria muito que entendessem...
Incrível, mas a única pessoa que me entendeu e apoiou, foi o meu marido. Embora quando abordei o assunto de que "se calhar não é arquitectura que quero fazer" ele tenha reagido mal e não tenha percebido na altura, eu querer "jogar fora" anos de estudo.
Namorávamos na época, e ajudou-me em todo o processo inicial, principalmente quando tinha grandes discussões com os meus pais. Apoiava-me indo aos locais onde ia dançar e chegou mesmo a aprender um pouco de percussão para me acompanhar em exibições!!!
Muito me disseram que me ia arrepender, e não desminto que já houve momentos que pensei: " o que fiz da minha vida, devia ter feito o estágio e estar num atelier", mas são só momentos. Adoro a minha Vida e adoro o que faço, sinto-me orgulhosa de ter sido eu, na altura certa, ter pegado nas rédeas do meu futuro, e ter ouvido o meu coração, não me deixando influenciar por preconceitos, opiniões, experiências de vidas, o que dá dinheiro, estabilidade, etc... Escolhi dançar, escolhi sentir-me bem naquilo que faço, embora seja difícil o caminho, mas pelo menos é o Meu caminho.

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