Ir ao Cairo significa para mim, entre outras coisa, ir beber da fonte (ou seja ir fazer aulas) e assistir a shows das minhas bailarinas preferidas.
A meu ver, quando se pratica uma modalidade, neste caso dança, de um país ou de uma cultura diferente da nossa, só se consegue progredir e compreendê-la quando vamos directamente a esse país ver como ela é e como é praticada na realidade.
A senhora Raqia Hassan, antiga bailarina da Reda Troup, percebeu á cerca de uma década atrás, isso mesmo, o quão importante e vantajoso seria criar um festival que reunisse vários bailarinos e professores maioritariamente egípcios, a fim de que centenas de profissionais por todo o mundo fossem directamente ao Egipto aprender a verdadeira Dança Oriental e assim levarem consigo essa aprendizagem e ensinarem/mostrarem aos milhares de alunos e curiosos que existe de por todo o mundo.
A ideia era fantástica e visionária. Já que a Dança era praticada por todo o lado, não só no Cairo, e já que tinha uma aderência por parte do público muito grande e quase imediata, porque não chamar esses bailarinos lá á fonte, ensiná-los, e depois irem pelo mundo fora mostrar a cultura árabe em forma de dança. Os árabes têm um orgulho muito grande da sua dança, e acham que eles melhor que ninguém é que sabem dançá-la, ou melhor senti-la, e não há melhor professor de Dança Oriental que um egípcio. Assim, já que querem dançá-la ao menos aprendam connosco! Era, e é esta a filosofia dos festivais organizados pela Raqia, mas como tudo no mundo árabe uma boa ideia vira um excelente negócio... e se dá certo então á outros xicos espertos a copiar essa mesma ideia e logo ela vira um pretexto para uma "guerra" que o objectivo é ganhar muito dinheiro e derrubar o adversário.
Infelizmente é o que se passa actualmente no Cairo. Quando à uma década atrás só havia um festival pequenino, com pouco apoio por parte de professores e bailarinos, existe agora vários festivais, workshops, cursos onde se pode aprender/aperfeiçoar a dança numa batalha declara, para ver quem consegue o maior número de "profissionais" e curiosos por todo o mundo adiram a tal festival ou curso.
Existe vários grupos que organizam eventos mas a guerra está instalada principalmente entre os dois maiores grupos: a organização da Raqia, que foi a pioneira e o Nile Group que lhe seguiu os passos.
Para quem tenha curiosidade e pretenda ir frequentar algum dos cursos, pessoalmente, e pelo o que oiço de várias pessoas que já frequentaram os festivais dos dois grupos, prefiro o que a Raqia organiza. Por três razoes: primeiro porque tendo sido a pioneira ainda detém os melhores professores, segundo porque vão lá ensinar e dançar nas galas as bailarinas mais conceituadas do momento (muitas temem a madame Raqia) e terceiro porque que já conheço a Raqia, os seus colaboradores e como funcionam, assim consigo o que quero sem ter de me chatear (muito). Este grupo só tem um grande incoveniente: é muiiiiiiiiito caro... quase o dobro do que o Nile group organiza. Estão a perceber a guerra, cada vez mais os festivais da Raquia têm menos pessoas, o que para mim é uma vantagem, quanto menos galinhas num capoeiro melhor e o Nile group vai cada vez mais ganhando terreno com mais alunos, por ser mais barato.
Também para que não sabe, a Raqia organiza três eventos por ano: o curso de folclore em Abril, o festival mundialmente conhecido e o que deu origem a tudo isto "Ahlan wa Sahlam" em Junho, e o curso para profissionais em Dezembro. O Nile group organiza por ano quatro festivais: um em Fevereiro, outro em Maio, outro em Setembro e outro em Novembro. Ou seja, há sempre algum a decorrer, para quem deseja ir lá e beber da fonte basta escolher de acordo com seus objectivos e finanças.
Como o meu objectivo é mais do que aprender coreografias ou movimentos novos, é compreender e assimilar a alma desta dança, prefiro, embora caríssimo, o curso que acabei de fazer aos festivais mais mediáticos.
É a segunda vez que faço este curso: Curso Intensivo para Profissionais, da Raqia Hassan. Não é um curso perfeito mas bastante completo e como o nome indica bastante intensivo. Trata-se de três workshops com a duração de três hora cada, com três professores diferentes. Ou seja estamos a falar de nove horas de dança por dia, com três coreografias diferentes de mais de cinco minutos cada uma, durante dez dia seguidos... é dose!!! Infelizmente, é impossível fazer todo o curso. Chega a uma altura que nem tens físico nem cabeça para aprender mais nada. A minha estratégia foi escolher os professores que fazia questão de participar nos seus workshops, assim, não me cansava com os que estavam ali só mesmo para encher horário. Como já conhecia quase todos, pude desta vez, assimilar mais do que que a primeira vez que fiz o curso e não ter ficado esgotada.
Foi muito bom... adorei cada professor que escolhi e conhecer outros. Recomendo vivamente!!!! É muitíssimo importante para quem quer fazer uma carreira séria de Dança que conheça e experimente vários estilos, mas quando de apaixona por um desses estilos continue a aprender com os melhores nessa área, e isso muitas vezes significa fazer sacrifícios e ir á procura fora do nosso país. A recompensa pessoal é grande e gratificante, garanto...
Também tive uma sorte enorme nas colegas de "turma". Algumas delas já conhecia do curso passado e as que conheci eram extremamente simpáticas, não houve atritos típicos de mulheres, até era bastante divertido quando saíamos juntas... éramos de quase todas as nacionalidades e mantemos contacto através do facebook! O que mais gostei, ao falar com elas, foi saber como é a condição das bailarinas de Dança Oriental um pouco por todo o mundo e as suas próprias experiências. Ficávamos ao jantar horas a falar... É incrível o que descobri! Conto no próximo post...
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