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As Minhas Memórias - 3ª parte - A Descoberta do Oriente


A Vida ás vezes traz-nos surpresas que nunca imaginámos, nem nos nossos sonhos mais ousados.

Para mim, durante muitos anos, a dança resumia-se a uma única modalidade: o Ballet. E foi precisamente no último ano que fiz ballet e que iria desistir de dançar, que de repente ouvi uma música diferente...

Eu era rececionista na escola de dança que frequentava: Academia de Dança de Lisboa que infelizmente já não existe, e reparei, que nesse ano lectivo (Setembro de 2001) ia haver uma nova modalidade: Dança Oriental. Nunca tinha ouvido falar em semelhante dança, juro que não fazia ideia do que se tratava e só pelo nome não me suscitava nenhum interesse. Aconteceu que numa das vezes que estava na recepção, sem fazer quase nada, começou uma aulas da tal dança e oiço a música. Foi magia! Aquela melodia entrou em mim como um suspiro que fez com que acordasse de um sono profundo. Não sei explicar, mas aquele tipo de música era-me familiar, e ressuscitou-me de tal maneira que fui espreitar a aula.

Claro que passar de espectador a praticante foi um passo. Comecei as aulas logo de seguida e tinha assim começado uma nova era na minha vida. Não fazia a mais pequena ideia do quanto me iria mudar e influenciar.

As primeiras aulas foram dramáticas. Parecia sei lá o quê a dançar, era um cubo de gelo e mesmo com 16 anos de dança não conseguia fazer praticamente nenhum movimento digno de Dança Oriental. Conseguia imitar bem a professora, até tinha coordenação, mas detestava ver o efeito quando me via ao espelho (é-vos familiar esta sensação?) sentia-me gorda, mal feita, feia, sem jeito nenhum. Mas não desistia, havia qualquer coisa divina que me mantinha nas aulas e acho que sempre foi a música. Adorava (e adoro) música árabe...

Lá fui continuando as aulas (mantendo as aulas de ballet ao mesmo tempo) e nelas fui-me obrigando a realmente ver-me no espelho, não só olhar, mas Ver-me. Á medida que ia aprendendo e fazendo os movimentos mais básicos da Dança Oriental, ia-me sentindo. E aos poucos fui percebendo que já não era assim tão má a figura que fazia, afinal não estava assim tão gorda, não estava assim tão feia, até é bem bonito estes movimentos em mim... fui-me apercebendo do incrível corpo que tinha, o quanto era bela, e o quanto é fascinante dançar.

Curiosamente, tantos anos de dança clássica e eu nunca tinha realmente dançado. Fazia exercícios, passos de dança, executava lindamente coreografias, mas dançar!? Foi nas aulas de Dança Oriental que comecei a dançar, sentir a música, expressar-me através daqueles movimentos tão simples mas complexos que, devido á carga energética que continham, "obrigaram-me" a desabrochar como uma flor na Primavera. Mas se pensam que este processo durou umas aulas, não, durou mais de um ano e esse desabrochar continuou e após 8 anos ainda continua... E foi precisamente nesse ano, que tinha o meu mais difícil exame de ballet (Junho de 2002), onde iriam avaliar a nossa capacidade de transmitir não só a técnica mas também Arte, que eu o "patinho feio", através do trabalho interno que a dança oriental me fez, consegui transmitir mais que um mero exercício, consegui transmitir dança, o que me fez passar no tal exame.

Por isso digo a todas as alunas: a Dança Oriental escolhe cada uma de vocês, não é por acaso que estão a praticá-la, muitas de vocês nem sabem bem o porquê que gostam tanto. Não quer dizer que todas tenham de ser bailarinas profissionais como eu, não! Isso é só para quem tem esse "chamado", esse "dom" ou essa "missão" nesta vida. A Dança Oriental escolheu-vos (como um dia escolheu a mim) pois tiveram a sorte de ter a oportunidade na vida, de descobrirem as deusas e os seres especiais que são. Se puserem de lado vaidades, egos, medos e comodismos, irão perceber como esta dança dá-vos o poder de se transformarem em cisnes, dá-vos força interior, faz-vos crescer espiritualmente, obriga-vos a dar um sentido na vida. E o mágico de tudo isso é que se vai reflectir em tudo e em todos que vos rodeiam.

Permitam-se mergulhar neste oceano, não tenham medo de sentir ou aperceberem-se de certos aspectos negativos na vossa vida que já se tinham resignado. Não! Saiam da vossa zona de conforto e cegueira e permitam que a dança vos melhore, transforme, dê-vos qualidade de vida interior.

Foi o que fiz, deixei-me levar para onde a dança me quis e como a minha vida se transformou! Eu que era uma pessoa forte mas insegura, que sentia mas não expressava de maneira nenhuma, que se tapava toda por vergonha do seu corpo, o "pãozinho sem sal" como me chamavam conseguiu ultrapassar todos os medos e mais alguns e aqui estou.

Parece um conto fantasioso, um processo fácil e rápido, mas não é! Tem sido uma viagem extremamente difícil e muitas vezes dolorosa mas digo-vos que vale a pena. Foi pela dança que consegui estar onde estou e ser a pessoa que sou hoje. Mas o processo continua, ainda tenho muito que desbloquear para que a minha dança se torne ainda melhor, mas principalmente, o conhecimento de mim própria seja cada vez mais profundo e a minha Vida progrida de dança para dança.

Comentários

  1. Mais uma vez... puseste-me uma lagriminha no canto do olho... Revi-me bastante neste texto... :)

    Muito sinceramente, é MESMO o que me tem custado mais nesta minha mudança para o Algarve... :(

    Beijinhos

    ResponderEliminar
  2. Olha eu entrei para a dança porque fiz uma aposta com uma amiga. Assustei-me na 1ª aula e pensei logo que aquilo não era para mim. Mas tinha feito a aposta e não ia desistir à 1ª!! Acabou ela por desistir e eu continuei a ir, apesar de me achar a coisa mais dejaseitada do mundo. Havia qualquer coisa nas aulas que me puxava. Na altura eu andava num grupo de estudos esotérico e explicava o facto dizendo que era a tua energia, a tua "aura" que me continuava a puxar para aquelas horinhas semanais. Demorei cerca de 1 ano a perceber que havia magia sim, mas que não era (só) tua! :)

    (opá uma pessoa acaba de vir do cinema, após um filme lamechas... pronto, só podia dar coisa lamechas!!)

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