Como prometido no post anterior,
vou continuar a falar-vos da minha experiência nos Festivais de Dança Oriental,
no Cairo. Neste, especificamente, falar-vos-ei dos workshops inseridos no
festival.
Vou ser directa e sincera: não
foi técnica que aprendi nas aulas dos Festivais, aliás, rapidamente percebi que iria aprender muito mais... ora vejamos:
1º - As aulas aconteciam
em espaços pouco (ou nada) preparados para uma aula de dança. Eram em salões de
banquetes ENORMES com um mini "palco" improvisado onde o professor
ficava e sem espelho.
2º - Ou tu chegavas bem cedo ao
workshop ou já não conseguias lugar à frente perto do "palco". Isso
significava o conseguires ver e ouvir em condições... mínimas.
3º - Não estava completamente à
vontade... estava rodeada de dezenas - e nos workshop com os professores
"cabeça de cartaz" eram centenas - de... histéricas. Sim, é esta a
descrição. Eu não tenho paciência para histéricas, cada uma mais espampanante
que a outra, em que maior parte não estava lá para aprender, mas para se
mostrar.
4º - Decorar uma
coreografia de 5/6 minutos em hora e meia ou duas horas... decididamente não é
para mim. Às tantas é uma confusão e só um 1/5 da sala conseguia decorar tudo.
Eu fazia parte das que não conseguia. Não que tivesse mais dificuldade que as
outras mas porque, chega a um ponto, é demais num curto espaço de tempo.
5º - As aulas, raras excepções,
eram um despejar de coreografias. E pouco esmiuçavam ou explicavam técnica. Se
apanhares, bom para ti, se não apanhares... azar.
6º - Quatro, cinco... seis
aulas por dia, é intenso e desgastante. Queres fazer o máximo que podes, mas na
prática... é demais.
7º - Era "obrigada" a
comprar um mínimo de workshops para ter o Pack do Festival naquele hotel e ter
assim acesso ao jantar de abertura e de encerramento que incluíam os espectáculos
principais. Senão gostasse do workshop ou, como aconteceu comigo, esse
professor não ter dado a aula, não me devolviam o dinheiro.
E agora devem estar neste
momento a perguntar: "Então para que é que ias?"
Ía porque:
1ºa) Embora os salões não
estivessem preparados para aulas de dança, como bons árabes que são, adaptavam
rapidamente. E tudo que fosse preciso, eles lá arranjavam. E eu, lá tinha
também de me adaptar a um outro modelo de aula. Preparava-me para ir de
"cabeça aberta" pois nunca sabia o que iria encontrar.
2ºa) Não me dava ao trabalho de
chegar muito cedo. Chegava sim antes do professor (que chagava praticamente na
hora ou atrasado) e fazia questão de me colar ao palco, nem que fosse na
lateral. À grande e à "portuguesa" lutava pelo meu lugar e ter espaço
para executar a aula, porque colavam-se!!! E, ai de mim se tivesse de ir à casa
de banho... não podia, pois quando voltava já não tinha lugar.
3ºa) Tentava por tudo, focar-me
na aula e no que queria aprender. Habituei-me lá a abstrair-me do
"barulho" à minha volta. Mas confesso que não era fácil. Haviam
muitos grupos e eu estava sozinha.
4ºa) Rapidamente percebi que
não valia a pena decorar "à pressa" toda a coreografia da aula. E
eram assim os workshops: coreografias. Boas coreografias mas às tantas, como
disse, era demais num curto espaço de tempo para depois esquecer e ter de
decorar outra logo de seguida noutra aula. Então optei por fazer o que me
interessava: sequências que achava interessantes ou ligações de movimentos que
me chamavam a atenção. Principalmente, observava ao mínimo detalhe, ali ao vivo
e bem perto, o/a bailarino/a a executá-los. Daí eu também "colar-me"
ao palco, para ver e ouvir bem. Praticamente todos os professores traziam os seus
músicos e isso era um privilégio: ter aula com músicos experientes ao vivo e
ver a interação destes com a bailarina (ou bailarino).
5ºa) Nas primeiras duas/três
vezes, ainda fiz questão de decorar toda a coreografia, também para "não
parecer mal"... depois, quando resolvi não decorar tudo, percebi que ninguém
ligava se estava a fazer ou não... muito menos o professor!
6ºa) Com a experiência, fui
marcando workshops espaçados... no máximo dois por dia estava ótimo para mim.
7ºa) Houve workshops que eu tinha
muita espectativa e depois não foram nada de especial e outros, que até não
dava nada por eles mas, acabaram por se revelar surpreendentes. Um grande
bailarino de palco não é forçosamente um bom professor e percebi que, os
melhores workshops eram dos que não eram tão conhecidos. Há medida que fui
conhecendo, fui sabendo escolher melhor que workshops frequentar para tirar
melhor partido no que me interessava.
E o que mais me interessava não
era técnica pura e dura. Era tudo que estava por detrás dessa técnica
coreografada: a energia, a comunicação, a maneira, a forma inesperada de
executarem o mesmo, a atenção aos pormenores, ouvir e ver, sentir como cada
movimento fazia sentido, a alegria contagiante que envolvia centenas de pessoas
a fazer o mesmo. O ambiente era tudo. E quando se entusiasmavam, músicos,
professores e alunos, criava-se uma energia difícil de descrever. Era mágico. E
eu, sentava-me muitas vezes só a observar e a absorver toda aquele espectáculo
que eram aquelas aulas.
Assistir aqueles bailarinos, despojados de barulho externo, sem maquilhagem ou figurinos, simplesmente a dançarem, a dar de boa vontade e sem pretensões de agradar... é mágico. E foi essa a técnica que aprendi nesses workshops lendários. Vi verdade, senti pureza, ouvi muito bons concelhos de gente experiente. Sei que, embora fosse um negócio, estes Festivais pioneiros tinham uma integridade e uma inocência, que se perdeu e nunca mais se vão repetir. O mercado mudou, estendeu-se, fragmentou-se. Aquela energia dificilmente volto a encontrar, com muita pena. Nunca vou esquecer pessoas que conheci e valores que adquiri e que me acompanham todos estes anos.
Nesta Foto: num dos workshops que participei em Junho 2007
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