Avançar para o conteúdo principal

Como é ser Mãe e Bailarina?

Esta foi uma das perguntas que me fizeram ao longo do mês de Novembro. Confesso que é uma pergunta difícil... sem uma resposta concreta e objectiva. A maternidade é tudo menos uma linha recta e, ser bailarina não é uma "profissão" qualquer.

Sei que, para todas as mães, gerir e alavancar uma carreira é algo... para lá de desafiante. Exige um equilíbrio que, para grande maioria das mulheres, é desgastante e frustrante. Ser mãe, no mundo do trabalho, seja qual a profissão for, não é o mesmo que ser pai. Para nós, é muito mais difícil e exigente, onde a balança não está - nunca - equilibrada. 

Ser Mãe e Bailarina não é muito diferente de todas as outras profissões mas há aqui um factor, que é incontornável, e que pesa (muito) nessa tal balança: o factor físico. É que o meu corpo, é o meu instrumento primordial de trabalho. E ter sido mãe, mudou esse meu instrumento. De repente, há um período na gravidez, que por mais em "forma" que estejas, não consegues mais... e tens mesmo de parar. E parar, para quem faz da dança vida, significa não ganhar sustento. E não, não há subsídios. Pelo menos eu, não tive direito a nenhum. 

Comigo aconteceu essa paragem no último trimestre da minha gravidez... simplesmente não conseguia mais dançar. A barriga era enorme... eu estava enorme. Para mim, foi muito duro lidar com isso. Nesse momento, percebi que nunca mais teria a liberdade que tanto presava e, dava por garantida. Depois segue-se o parto e o pós-parto que dura... e dura... e dura. Demora meses, anos até, para "voltarmos" a nós. Física, psicológica e emocionalmente. É um processo que nos transforma para sempre.

Nos primeiros anos de vida do filho, dançar e criar um ser, é muito pouco compatível. Faz-se. Mas, não é a mesma coisa. Não temos tempo para nos dedicarmos. Não temos espaço mental para criarmos. Não temos força física para aguentar os ensaios, aulas, treinos. Não temos disponibilidade para sentir e disfrutar. Posso até dizer, que nesses primeiros tempos, não há vontade de dançar.

Como me culpei por sentir tudo isso... como pensei que nunca mais iria dançar. 

Ser Mãe e Bailarina é duro. É injusto. É complexo. E é muito... muito solitário. De repente sentes-te tão sozinha que a única coisa que te mantem "sã" ironicamente, é o teu filho. 

Ser Mãe e Bailarina não é para todas as bailarinas... porque a tua carreira fica mesmo em segundo (terceiro ou quarto) plano. Deixas de ser o centro das atenções e deixas de dar atenção. Perdes público e alunos.

Ser Mãe e Bailarina é renascer numa nova pessoa. Com uma nova visão da dança. Com um novo corpo. Com uma nova mente.

Ser Mãe e Bailarina é ter consciência que vai perder liberdade e, consequentemente, dinheiro. Que não vai conseguir dançar em todos eventos. Muito menos à noite. Que não consegue ir a todos os espectáculos e dar todas as aulas.

Ser Mãe e Bailarina é ter de escolher. Escolher bem como gere o seu tempo e energia. Porque o palco passa a ser outro. E a sua dança passa a ter o maior fã: o seu filho.

Apesar de todas as dificuldades, solidão, desafios, frustações, culpas, ser Mãe e Bailarina é maravilhoso. Porque a nossa dança passa para um outro patamar. Passa a ser uma dança Cuidada. Valorizada. Amadurecida. Triada. Poderosa de quem gerou Vida. Passa a ser Única.

Ser Mãe e Bailarina é Poder. É Gerar. É... AMAR e saber transparecer esse Amor com a sua dança.








Comentários

Mensagens populares deste blogue

Diário de Uma Professora de Dança Oriental - #aula34

 Querido Diário, Foi no passado sábado que aconteceu a terceira aula presencial (e última) desta época lectiva. Estas aulas extraordinárias são importantes. Essenciais para podermo-nos conectar sem o filtro do OnLine. Como já tinha dito anteriormente, por uma questão prática - e não só - as aulas online são eficazes e resultam mas, nada substitui o estar, o “olho no olho”, o toque, o sentir no presencial. O ser humano é um bicho social que precisa desta troca energética e, na dança é fundamental. Por isso, estas aulas esporádicas tornaram-se um encontro ainda mais especial. Porque ali, naquele espaço seguro, aproveitamos ao máximo cada momento. Cada riso. Cada movimento. Cada silêncio reflectido num olhar. Cada palavra traduzida numa dança. Saímos com a alma leve. Com a sensação que valeu cada minuto. Nestas aulas, faço questão de levar a minha filha, que vê e aprende, sem pressões ou espectativas, a minha arte. Assiste ao respeito que nutro pelas alunas neste ...

Diário de Uma Professora de Dança Oriental - #aula33

 Querido Diário, O nosso estado de espírito influencia a qualidade da nossa dança. Sempre senti isso. Junho, sol, feiras populares é sinónimo de boa disposição que se reflecte logo na dança. Foi nesse espírito que aconteceu a #aula33 e foi uma aula 5 estrelas. Houve disponibilidade para a criatividade onde a Improvisação - com método - foi rainha. É impressionante como é na prática que se consegue (também) os resultados. Com regularidade nas aulas, as alunas estão cada vez mais, à vontade para Improvisar e, a fazê-lo bem. Como já disse várias vezes, Improvisar custa. Não é algo óbvio ou intuitivo. Não basta ter talento. Tem de haver investimento de tempo a ir às aulas. Disciplina para cumprir um método de trabalho técnico e, muita vontade. De superar desafios, metas e até, crenças.   Segue-se, uma aula presencial... estou ansiosa para estar com as alunas e partilhar energias e claro, dança... muita dança. Depois conto-vos tudo!

Diário de Uma Professora de Dança Oriental - #aula32

 Querido Diário, E chegámos ao final do mês de Maio e a #aula32 acontece numa data muito particular para mim... Foi o dia que comemorei 18 anos de casamento. Sim. 18 anos. Enquanto dava a aula - online, no meu estúdio em casa - o meu marido cuidava e, preparava algo especial e diferente para nós usufruirmos depois da aula terminar e a filhota dormir. A presença e o incentivo por quem nos conhece e acompanha é fundamental no sucesso de quem escolhe uma vida artística. De uma maneira diferente de há mais de 20 anos atrás, hoje, o meu também marido, continua a respeitar e a apoiar o meu percurso que é muito mais do que se vê nos “palcos”. Os bastidores deles são de uma brutalidade inexplicável que só quem os vive sabe. E o meu companheiro de há 25 anos, sabe. Ele vive, e viveu, todos estes espaços e momentos comigo. Todos os altos e baixos. Para bem e para o mal. Talvez seja isso que é verdadeiramente um casamento. Na festa, precisamente há 18 anos atrás, dancei... e o...